quinta-feira, março 11, 2010

A Tauromaquia, um "bem cultural" a preservar tal qual?


No parlamento catalão está a decorrer uma discussão sobre a eventual abolição das touradas naquela região autónoma da Espanha. Podemos admitir que este debate tem um fundo duplo porque não se trata só de definir se de facto a tauromaquia é classificável como uma actividade cruel em relação a animais vivos mas também porque bastantes Catalães confundem a tauromaquia com uma Espanha centralizadora, tradicionalista e mais sulista (la España negra) com a qual não se podem ou querem identificar. Enquanto se desenrolaram estas discussões em Barcelona, Esperanza Aguirre, a Presidente da Comunidade de Madrid, numa conferencia de imprensa encenada no meio de uma "Plaza de Toros", declarava a Tauromaquia como sendo "un bien de interés cultural". Valência e Múrcia tomaram iniciativas no mesmo sentido e...por pura coincidência, a Ministra Gabriela Canavilhas anunciou em Portugal a criação de uma secção de tauromaquia no Conselho Nacional de Cultura. Bem, é um facto inegável que a tauromaquia faz parte da cultura de quase todos os povos ibéricos, na condição de optarmos por definir a palavra "cultura" como "um conjunto de costumes, de instituições e de obras que constituem a herança social de uma comunidade". Todavia, o fundo da questão não é esse: o ponto essencial é se devemos manter a qualquer preço todas as manifestações que fazem parte da nossa cultura tais quais, sem nunca nos interrogarmos sobre a necessidade da sua continuação à luz da evolução na nossa sociedade: a "cultura" pode-se dissociar dos valores morais em vigor? Alguns exemplos gritantes da evolução possível do conceito "bem cultural" : os antigos jogos circenses no Coliseu faziam intimamente parte da cultura Romana, mas a nós provocam repugnância pela sua crueldade extrema; a prostituição sagrada nos templos era uma realidade religioso-cultural entre os povos da Babilónia, para nós em 2010 parece sem dúvida uma prática inconcebível. Neste contexto parece-me insensato manter obcecadamente como "bem cultural intocável" uma actividade que consiste em perseguir, torturar e finalmente matar - de maneira sangrenta - um animal, mesmo que seja criado para o efeito. O facto de Hemingway, Picasso ou outros grandes artistas terem glorificada a lide, não muda em nada a sua crueldade inerente: espetar com força pontas de aço na pele de um bovino vivo ou enfiar duas ou três vezes uma espada nos seus pulmões têm muito pouco caracteristicas de uma expressão artista. Em relação com a fábula das endorfinas que protegeriam o touro contra as dores, só posso dizer que "se no è vero, è ben trovato": no final será que o touro ensanguentado no meio da arena está a mugir de prazer? É uma atitude errada considerar aquela tradição ibérica como sendo uma coisa única no Mundo, sistematicamente estigmatizada por ignorantes. De facto, vários outros povos na Europa tinham também enraizadas na sua cultura algumas tradições cruéis com animais e não hesitaram em desistir delas; posso mencionar algumas: na cidade de Ypres (Be) era tradição desde a Idade Média de atirar gatos vivos de uma torre na altura das Festas da Cidade, já nos finais do século XIX os felinos vivos foram substituídos por exemplares em peluche; no norte da França e na Bélgica, os combates de galos eram um "desporto" centenário extremamente popular (amplamente representado na literatura e na pintura): foram proibidos num e estão a ser gradualmente extintos noutro país ; nos Países Baixos existe o costume milenar "das corridas de gansos" (nas quais um cavalheiro tenta arrancar em pleno galope a cabeça de um ganso vivo pendurado): acabaram já há bastantes anos com esta desumanidade; finalmente desde os tempos imemoriáveis existem na minha Terra os concursos de canto para tentilhões, outrora cegava-se os pássaros para estimulá-los a cantar mais, é óbvio que esta barbaridade foi interdita. Só para dizer que a palavra "cultura" não pode servir para legitimar actos contra a dignidade humana como é percebida no dia hoje. Não apelo à proibição imediata e total da "Festa" taurina, mas sugiro um trabalho de educação e sensibilização junto dos jovens no sentido das gerações futuras puderem julgar elas-mesmas se o sangue de um touro tem o mesmo valor cultural da tinta vermelha num quadro de Goya.

In Catalunie worden de thans stierengevechten in vraag gesteld. Ondertussen werden die in Portugal, Madrid, Murcia en Valencia tot Cultureel Erfgoed gepromoveerd. Toch een ietsje te straf vind ik, het bloed en het lijden van een stier tot kunstwerk te verheffen. Tenslotte hadden wij ook in de Lage Landen vormen van dierenkwellerij in onze tradities, waar we van af gestapt zijn: ganzenrijden, hanenvechten, kattenwerpen in Ieper, het blind maken van zangvinken, etc.