
Há na
Alemanha uma velha Lei, ainda em vigor, (das Reinheitsgebot de 1516) que define
que só pode ser denominada cerveja a bebida que resulta da fermentação de água,
cevada e lúpulo, um regulamento que dificulta a comercialização de cervejas
estrangeiras naquele pais como por exemplo as nossas que contêm também milho ou
arroz.
Definir critérios de pureza ou de autenticidade foi sempre um método para
justificar exclusões não só a nível comercial mas também na política.
Assim, na altura das eleições autárquicas surge sempre no microcosmo político
de Penela um certo discurso parecido com a velha Lei referida: existe algures (e
sabemos todos onde) um Penelense mais puro do que os outros e só ele tem
capacidade para gerir Penela, só ele tem a exclusividade do Amor Sincero à Terra,
só este ser humano ideal conhece a fundo Penela, cada instituição, cada pessoa,
cada galinha, cada arbusto, cada m2 e só esta criatura, quase mítica, pode
resolver os problemas do concelho (se porventura ainda sobrasse algum…). Dom
Sebastião, Superman e o Pai Natal estão bem vivos e visivelmente entre nós.
Dizer que é um caso de xenofobia “soft” a nível paroquial seria talvez
exagerado, mas que consta de uma atitude latente de discriminação mental, uma
tradução suave da doutrina “Blut und Boden”, de certeza é: respeitamos os de “fora”
e tratamo-los bem, mas na profundez da nossa alma estamos convencidos que somos
de longe, de muito longe, os melhores de todos em tudo.
Assim atinge-se o cúmulo do sofismo:
1. quem viveu sempre neste concelho é melhor do que os outros;
2. só o melhor serve para dirigir este concelho;
3. só alguém que viveu sempre em Penela é capaz de ser Presidente deste
concelho.
Para os especialistas em “empreendorismo” e “gestão” que abundam nesta Terra,
não será segredo que muitas empresas grandes e sérias façam exactamente o
contrário: para preencher vagas no topo, recorrem sem hesitar a elementos de
fora, frequentemente sem qualquer ligação a ou experiencia no ramo, a fim de
introduzir ideias frescas e novos impulsos dinamizadores e para se libertar de comportamentos
estereotípicos e de vícios instalados. Dispor de um campo de visão largo não pode
ser unicamente o resultado de algumas deslocações, leituras ou participações em
congressos, não, depende basicamente de experiências interiorizadas e adquiridas mediante trabalho a sério,
inserido numa sociedade competitiva. De facto -se não fosse assim - os peixes
de aquário seriam seres muito mais inteligentes, pois observam dia após dia,
anos após ano, a vida humana na sala de estar dos seus donos. Para além disso, estas
mesmas pessoas devem ter ficado muito indignadas (claro, só interiormente) quando
num passado recente foram confrontadas com candidaturas paraquedistas como a de
Santana Lopes na Figueira e devem estar diariamente enjoadas (claro, só
interiormente) quando observam no dia de hoje como alguns trocam de concelho,
como nós mudamos de calças: Ílhavo por Aveiro, Sintra por Lisboa ou Gaia por
Porto…
Honestamente, não gosto da ostracização pública e “a priori” de candidatos para
as eleições autárquicas que – supostamente - não disponham de um certificado de
origem adequado: a exigência para a endogeneidade absoluta pode ser justificada
para chouriços, vinhos e queijos, mas para o futebol e a política não é tão manifesto.
Tudo isto deveria ser ainda mais evidente num país gerido há dois anos – a
convite do Governo de Portugal - pelos puríssimos estrangeiros da Tróika, que
além de ter a tarefa de (tentar) endireitar – mais uma vez - as finanças de
Portugal, servem de “bode expiatório” perfeito para canalizar e absorver a ira
pública contra os cortes, a austeridade e a pobreza.
Ao contrário do que querem fazer crer ao Povo, é exactamente a hibridização, a
introdução de elementos alheios, que vitaliza e dinamiza. Por tudo isso digo em
voz alta: bem-vindo à diversificação, à pluralidade, à heterogeneidade; não
abram só as portas, mas também as janelas, puxem os autoclismos e liguem
ventiladores e exaustores...
Para bom entendedor meia palavra basta.